Diocese de Campo Limpo marca presença no 2º Encontro Estadual Fé e Política

No sábado 24 de maio, aconteceu o 2º Encontro Estadual Fé e Política de São Paulo, com o tema Democracia, Ecologia Integral e Emergência climática. Foram 120 participantes de 10 municípios do estado de São Paulo, em sua maioria agentes e coordenadoras(es) de pastorais, participantes de CEBs, representantes de grupos e comissões diocesanas de fé e política e religiosas(os) católicas(os), mas também alguns representantes de outras igrejas cristãs - metodista, batista e evangélica, assim como representantes das religiões muçulmana, espírita, matriz africana; diferentes expressões de fé em diálogo fraterno, trazendo suas contribuições para as reflexões sobre a Ecologia Integral e o enfrentamento da emergência climática, a partir da Campanha da Fraternidade.
No 1º Encontro Estadual, realizado em 2 de março de 2024, haviam sido 250 participantes de 15 municípios do estado de SP debatendo as profundas relações entre as ações das pastorais sociais e dos movimentos populares, buscando a construção e apoio a candidaturas progressistas nos diversos municípios, com a definição de pautas a partir das demandas dos territórios, em defesa dos direitos sociais e por políticas públicas comprometidas com as(os) pobres e excluídas(os). O 1º Encontro Estadual também foi uma preparação para o 12º Encontro Nacional de Fé e Política, que ocorreu em abril do ano passado em Belo Horizonte, com o tema Espiritualidade Libertadora: Encantar a Política com Arte, Cultura e Democracia.

O 2º Encontro Estadual iniciou-se por uma homenagem ao querido Papa Francisco, no dia em que se celebravam os 10 anos da Laudato Si, a Encíclica de análise do contexto socioambiental de nosso tempo, o tempo da urgência climática e da defesa da vida em todos os âmbitos. Foi lida e aclamada uma declaração sua, entre as muitas e tão inspiradas pelo Espírito Santo:
“Aos governos em geral e aos políticos de todos os partidos, quero pedir-lhes junto aos pobres da Terra que representem a seus povos e trabalhem pelo bem-comum. Quero pedir-lhes a coragem de ver o seu povo, olhar nos olhos de sua gente, e a coragem de saber que o bem de um povo é muito mais do que um consenso entre as partes. Evitem escutar apenas às elites econômicas, portadoras tantas vezes de ideologias superficiais que escapam dos verdadeiros dilemas da humanidade. Sejam servidores dos povos que clamam por terra, por teto, por trabalho, por uma vida boa, o bem-viver indígena, que não é o mesmo que a dolce vita, o dolce far niente, mas o bem-viver humano, que nos põe em harmonia com toda a humanidade, com toda a criação.
Quero pedir também a todos os líderes religiosos que nunca usemos o nome de Deus para fomentar guerras nem golpes de Estado. Estejamos junto dos povos, dos trabalhadores e dos humildes e lutemos junto a eles para que o desenvolvimento humano integral seja uma realidade. Construamos pontes de amor para que se ouçam as vozes das periferias, com seus lamentos, mas também com seus cantos e com a sua alegria. É necessário que juntos enfrentemos os discursos populistas, de intolerância, xenofobia, aporofobia, que é o ódio aos pobres, como todos aqueles discursos que levam à indiferença, à meritocracia e ao individualismo, narrativas que só serviram para dividir nossos povos, minar e neutralizar nossa capacidade poética, a capacidade de sonhar juntos.
Irmãs e irmãos, sonhemos juntos, e assim como peço isso com vocês, junto a vocês, quero também transmitir-lhes algumas reflexões sobre o futuro que devemos construir e sonhar esse futuro. Disse reflexões, mas talvez coubesse dizer sonhos, porque neste momento isso não alcança apenas o cérebro e as mãos, mas precisamos também do coração e da imaginação; necessitamos sonhar para não retroceder, necessitamos utilizar esta faculdade tão especial do ser humano que é a imaginação, o lugar onde a inteligência, a intuição, a experiência e a memória histórica se encontram para criar, compor, aventurar, arriscar. Sonhemos juntos, porque foram precisamente os sonhos de liberdade e igualdade, de justiça e dignidade, os sonhos de fraternidade que melhoraram o mundo. E estou convencido de que nesses sonhos se vai colando o sonho de Deus para todos nós, que somos seus filhos. Sonhemos juntos, sonhem entre vocês, sonhem com o outro, saibam que estão chamados a participar dos grandes processos de mudança como lhes disse na Bolívia [no Encontro Mundial dos Movimentos Populares]: o futuro da humanidade está em grande medida em suas mãos, em sua capacidade de organizar-se, em sua capacidade de promover alternativas criativas. Está em suas mãos.”
A Laudato Si e as inúmeras contribuições do Papa Francisco, a partir das reflexões de ambientalistas e de cientistas nas últimas décadas, foram também pontos da reflexão de Moema Miranda, OFS, da REPAM, Assessora da Comissão para Ecologia integral e Mineração da CNBB, antropóloga, professora do Instituto Teológico Franciscano. Na manhã do encontro, Moema Miranda, que foi uma das assessoras na elaboração do texto-base da Campanha da Fraternidade deste ano, destacou em sua apresentação a urgência do enfrentamento das mudanças climáticas por todos os povos, a valorização das experiências e dos saberes dos povos indígenas para construção de uma vida em harmonia com o meio-ambiente, a busca de conservação dos biomas brasileiros em sua totalidade, lembrando que para nós cristãs(os) há uma diferença fundamental entre Natureza e Criação: a Criação pressupõe a mão de Deus, a noção de que tudo foi criado por um Deus de Amor, Misericordioso e que conduz a humanidade para o cuidado da Casa Comum. Em seguida, as(os) representantes das diversas religiões apresentaram suas contribuições e diferentes perspectivas para a temática ambiental.

Enquanto se realizava o 2º Encontro Estadual, somaram-se as vozes àquelas das pastorais, coletivos e movimentos da região do Vale do Paraíba, reunidos no mesmo dia para fortalecer as lutas contra a instalação de uma termoelétrica em Caçapava, que geraria a emissão de até 6 milhões de toneladas de CO2 por ano. Também coletivos da capital estavam na mesma manhã em protesto no Butantã contra a retirada de 3 mil árvores no Instituto Butantã, região de Mata Atlântica preservada que está sendo ameaçada para construção de novos pavilhões para a produção de vacinas, quando há diversas alternativas, como áreas e mesmo prédios já parcialmente construídos na USP que poderiam ser disponibilizados para este fim.
Sobretudo as vozes somavam-se também às lutas contra o PL da Devastação ambiental (PL 2159/2021), aprovado no Senado Federal na quarta-feira anterior ao encontro (21 de maio) e que agora voltará à Câmara dos Deputados. Ressaltou-se a importância de continuidade das mobilizações contra a aprovação desse gravíssimo retrocesso que busca acabar com a fiscalização e o licenciamento ambiental no país, em tentativa de grupos de interesse já há 20 anos, mas aprovada agora, mesmo depois das terríveis tragédias em Mariana por ação da Samarco, em Brumadinho pela Vale do Rio Doce e em Maceió pela Braskem. Acompanhe e participe da campanha de pressão através do site: www.pldadevastacao.br.
Durante a tarde, refletimos sobre as ameaças à democracia e a importância das lutas dos movimentos populares. Prof. Jung Mo Sung, teólogo e cientista das Religiões, pesquisador das relações entre Teologia e Economia, retomou que a fé em suas dimensões antropológica e religiosa parte de uma aposta fundamental na vida, sendo que a fé cristã se baseia no ensino fundamental de Jesus Cristo de que todos somos iguais, pois todos somos filhos de Deus e destacou a importância da construção histórica de concepções e práticas políticas coerentes com estes pressupostos fundamentais, assim como questionou as concepções e práticas da extrema-direita de supremacismo (não igualdade humana) e de reação radical às lutas em defesa dos Direitos Humanos civis, políticos, sociais e ambientais, trazendo como pergunta para a reflexão coletiva o que é democracia no mundo de hoje de acordo com a tradição cristã e quais os desafios para a construção de uma pastoral/pedagogia libertadoras sob a perspectiva cristã.
Graça Xavier, bacharel em Direito, especialista em Direitos Humanos e Políticas Públicas, coordenadora da União dos Movimentos de Moradia de São Paulo (UMM), da União Nacional por Moradia Popular (UNMP) e da Red Mulher e Habitat da América Latina e Caribe, participante da Pastoral da Moradia, trouxe as contribuições dos movimentos de moradia no Brasil e em São Paulo para a garantia do direito humano fundamental de moradia, consolidado em nossa Constituição Federal e concretizado em políticas públicas de moradia popular, sobretudo na experiência dos mutirões de auto-gestão. No entanto, esse direito fundamental segue sob constante ameaça, inclusive pelo Estado com o uso das forças policiais em ocupações populares e contra aquelas(es) que lutam por esse direito, sobretudo da Região Metropolitana de São Paulo. Acompanhem as ações da União Nacional por Moradia Popular em https://unmp.org.br/ e da Campanha Despejo Zero em https://www.campanhadespejozero.org/
Pe Julio Lancellotti lembrou a todos que fazemos parte de uma história que também é dos mártires Bartolomeu de las Casas, Margarida Alves, Santo Dias e de grandes referências da fé como Dom Paulo Evaristo Arns e Dom Luciano Mendes de Almeida; a importância de se fazer parte e estar nas lutas de resistência com lucidez, discernimento e capacidade de análise, conscientes de que podemos perder, mas que é preciso estar onde esteve e está Jesus, junto dos excluídos e marginalizados, nunca de regimes autoritários e violentos; com fidelidade à defesa da vida, que é frágil; ter direção, sentido, simplicidade, perseverança e constância na defesa da população em situação de rua, das crianças e adolescentes, das mulheres, da população negra, dos povos indígenas; defesa das(os) encarceradas(os), das mulheres trans, defesa dos que mais são atacados em seus direitos humanos, pois “É preciso lembrar sempre que Deus está no meio de nós, Deus é como Jesus, Misericordioso e um Deus que nos ama, de acordo com nossas necessidades. Leiam os olhos dos pobres, dos que choram, dos que sofrem e pingue nos olhos deles um colírio chamado amor e compaixão”.

Por todas essas realidades, somando-se às lutas ambientais e em defesa da democracia e dos direitos sociais em nosso estado e país, com esperança, reunidas(os) nos Grupos de Trabalho por região do estado, foram partilhadas as ações coletivas das pastorais, grupos e movimentos em relação ao meio-ambiente e às lutas sociais nos territórios. Para fortalecer as ações das Pastorais da Ecologia nas dioceses do Regional Sul 1 da CNBB, vejam: https://www.cnbb.org.br/guia-de-implementacao-da-pastoral-da-ecologia-integral/, em nossa Diocese: https://dcl.org.br/noticias/diocese/ecologia-integral-nova-cartilha-da-diocese-destaca-o-cuidado-com-a-vida/
Por fim, na Mística de encerramento do encontro, partilharam-se em oração as dores dos povos indígenas, daquelas(es) que sofrem com as guerras, sobretudo em Gaza, daquelas(es) que estão sendo ameaçadas(os) de desocupação de suas casas, desempregadas(os) em busca do sustento de suas famílias, vítimas do racismo, a Criação em risco pela ganância; mas também se partilharam alimentos e as lutas coletivas para superar todas essas dores.
Foi um importante dia de encontro, trabalho e de partilha de sonhos coletivos por mudanças efetivas em nossos contextos socioeconômicos, políticos e ambientais, localmente e, somando-se a articulações nacionais, também globalmente, pelo bem-viver para todos. Seguiremos nesse mesmo sonho para a construção do 13º Encontro Nacional de Fé e Política, que ocorrerá de 10 a 12 de abril de 2026 em São Bernardo do Campo.